NOVO RUMO - moção XIV Convenção do Bloco de Esquerda

27-01-2025

NOVO RUMO

Moção S

Queremos um novo rumo. No socialismo por que lutamos cabe toda a gente, com esperança e dignidade. Só assim fazem sentido ideias, propostas, políticas, palavras e ações. Lutar, falhar, errar, corrigir, porfiar. No Bloco de Esquerda, sempre.

Abrir o debate

Sem surpresa, os textos propostos pela maioria da atual direção não têm sinal de autocrítica: numa lamentação sobre tempos difíceis, insiste na indefinição política, com atomização entre várias lutas sectoriais, sem perspetiva revolucionária e socialista.

O Bloco de Esquerda (BE) envolve-se em movimentos sociais, considerando-os de importância igual à do movimento laboral. Na prática, a participação no movimento sindical tem estado muito aquém do necessário, ficando o campo aberto para estratégias sectárias do PCP. A estratégia para o movimento laboral e sindical está ausente dos textos e da prática da maioria da direção do BE.

A participação em movimentos está desligada de objetivos transformadores da sociedade. Em vez de se afirmar como força transformadora, antissistema e socialista, ou mais concretamente, ecossocialista, o BE vem assumindo um modelo de "movimento de movimentos" ou de "federação de ONG", focado em direitos humanos e sociais, indistinto de organizações social‑democratas como o PS e o Livre. A diluição ideológica arrisca fazer perder o capital de luta do BE associado à sua história, assim como a sua utilidade social.

Entendemos ser necessário um novo rumo para o BE. Na sequência do documento proposto na V Conferência Nacional (2024), decidimos apresentar esta moção.

Queremos um BE mais combativo, mais ligado às lutas, nomeadamente a laboral, com mais clareza nas políticas, maior participação e melhor democracia interna.

1. O Estado a que chegámos

Formado em 1999 a partir de organizações revolucionárias, o BE é reconhecido como um dos principais partidos da esquerda portuguesa, aquele que não hesita em defender a luta sindical, enquanto combate pelo progresso social e pelos direitos humanos.

Impulsionou leis como a que reprime a violência doméstica, a que permite a interrupção voluntária de gravidez, a despenalização do consumo de drogas ou a da morte assistida. Em década e meia, obteve cerca de 10% da votação nacional e a influência correspondente.

Em 2015, o BE foi determinante para retirar o país da austeridade, possibilitando a existência de um governo do PS que, por via da pressão que teve à esquerda, foi obrigado a devolver parte dos direitos e rendimentos retirados desde os últimos tempos dos governos de Sócrates. Os tempos de maior proximidade ao poder ampliaram a capacidade real de influenciar os acontecimentos, porém, acentuaram ilusões parlamentaristas.

A direção não entendeu os sinais, contraditórios, das eleições de 2019: estava iniciada uma espiral descendente. A orientação política principal continuou a ser um apelo à geringonça que estava morta, o que contribuiu para libertar políticas de direita do PS.

Os sucessivos escândalos e demissões criaram o cenário para o desastre eleitoral do PS. Nas eleições de 2022, havia a ilusão de que o BE recuperaria os votos "perdidos para o PS", mas não só não os recuperou, como ficou com a imagem de "partido do sistema".

O BE sofreu derrotas em todas as recentes eleições, aproximando-se da irrelevância política. Vive atualmente um momento crítico e o seu futuro depende das decisões a tomar nesta Convenção.

Um partido revolucionário tem de ser intransigentemente democrático, para fora e por dentro. O BE tem alguns mecanismos internos de funcionamento democrático, mas transformou-se num partido de funcionários, sujeitos à dependência económica e política de duas fações dominantes, que evitam que a discussão seja alargada ao conjunto dos aderentes.

Apesar destas dificuldades, mantemos uma base militante importante, tradição de luta e reconhecimento social. Porém, sem alterações importantes na prática política e no funcionamento interno, quer a base militante quer o reconhecimento social estão sujeitos a forte erosão.

2. O Capitalismo Atual

As classes sociais sofreram mutações nos últimos 150 anos, em articulação com a própria evolução do capitalismo. O proletariado diferenciou-se, penetrou em novas esferas da atividade produtiva, nomeadamente na área da reprodução social e dos serviços, atomizou-se em alguns dos seus segmentos, precarizo­u-se e organizou-se em plataformas. Apesar desta fragmentação, a classe trabalhadora constitui a larga maioria da população mundial, o que coloca novas exigências ao processo de organização da luta pelo socialismo, sem alterar o seu papel dirigente na luta social e política com vista a uma transformação radical da sociedade.

O processo de globalização capitalista vive adaptações resultantes da concorrência entre as principais potências económicas e militares do mundo. A pandemia introduziu um quadro um pouco diferente na organização das cadeias de produção e distribuição, e tornou mais complexo o sistema de abastecimento tradicional de algumas matérias-primas, de energia e de bens alimentares. Com a agudização da concorrência capitalista mundial algum protecionismo seletivo, criou-se um confronto económico entre os EUA e a UE e as novas potências, como a China, a Rússia, a Índia e outras de menor dimensão. A China saiu do seu modelo de grande fábrica de mão-de-obra barata e de fornecedor de produtos de baixa qualidade, para se tornar num país de grande desenvolvimento tecnológico, com acumulação capitalista muito rápida, beneficiando a oligarquia dirigente do PC Chinês. O desafio colocado pela Rússia é, sobretudo, de natureza militar e territorial, somando confrontos, tais como a invasão da Ucrânia.

O protecionismo anunciado pela administração Trump é mais que um desejo de liderança económica americana cada vez mais ameaçada pela concorrência inter-imperialista. Também revela o declínio relativo da grande potência que liderou o mundo no pós II Segunda Guerra Mundial e no período posterior à queda do Muro de Berlim.

Apesar do discurso triunfante de Trump, são muito diversos, mesmo contraditórios, os projetos e interesses que atravessam a sua administração, movidos pelos colaboradores diretos, como Musk ou Zuckerberg e outros. A possibilidade de colisão entre estes protagonistas estará sempre iminente.

Mais do que a inversão da lógica da globalização capitalista, está em marcha uma adaptação a novos contornos da rivalidade internacional, conforme a evolução do cenário político-militar. O capitalismo mundial, em particular a sua vertente financeira, busca desesperadamente o conjunto de circunstâncias que lhe permitam relançar a taxa de lucro. Nas últimas décadas, o neoliberalismo deu-lhe condições institucionais ideais para derrotar a classe trabalhadora e intensificar o grau de exploração, a todos os níveis. As ameaças de guerra generalizada e as guerras localizadas em curso ampliam o clima de corrida aos armamentos e a destruição de forças produtivas favoráveis ao relançamento capitalista. A concorrência chinesa, que ameaça sectores como o do automóvel, trará mais dificuldades ao capitalismo mundial, assim como mais desemprego e desvalorização salarial.

No mesmo sentido se configura o choque civilizacional entre o modelo de acumulação, assente na pilhagem de recursos naturais e na sobre-exploração dos trabalhadores, e o impacto brutal que as alterações climáticas impõem a nível global. Todos os sinais críticos da ultrapassagem de +1,5º Celsius na temperatura média do planeta, em relação à era pré-industrial, já foram atingidos e inscrevem-se numa progressão contínua e imparável.

Os recursos naturais da Mãe Terra colocam limites ao crescimento global e provam a justeza da análise de Marx quanto à contradição fundamental do capitalismo. Como se lê no Prefácio à Contribuição à Crítica da Economia Política (1859): "em certo estágio de desenvolvimento, as forças produtivas materiais da sociedade entram em contradição com as relações de produção existentes (…). Instaura-se então uma época de revolução social". É a época que nos coube viver.

3. Um novo ciclo de guerras?

O mundo bipolar da Guerra Fria desmoronou-se com o afundamento da União Soviética. Depois de algumas décadas de hegemonia incontestada dos EUA no plano económico e militar, novos arranjos estão em vias de se consolidar, com o aparecimento em força de China, Rússia, Índia, Brasil e outras potências regionais.

A hegemonia ocidental, como a temos conhecido, parece cada vez mais posta em causa pela afirmação de economias fortes e com grande potencial de crescimento, em pressão constante por um mundo mais multipolar. Contestam a hegemonia de qualquer das partes, ainda que sob ameaças de enorme instabilidade e da guerra. O próprio projeto Draghi, recentemente apresentado para o relançamento tecnológico e a recuperação europeia face ao resto do mundo, contempla um acréscimo de despesas militares que só tem sentido nesta lógica.

As guerras em curso são conquista, tal como o foram as duas grandes guerras do século XX. A diferença é que se seguem a três fracassos do capitalismo global. Primeiro, o fracasso da globalização, proclamada pelos grandes grupos monopolistas para conquista de novos mercados, esbarrou na emergência de novas potências económicas com mais e maiores argumentos de penetração no mercado mundial (BRICS, Coreia do Sul, regimes árabes, etc.). Depois, o papel secundário dessa disputa global por parte dos países da velha Europa, cada vez mais subordinados à hegemonia norte-americana. Por fim, a corrida aos armamentos e à "solução da guerra" como meio de recompor a hierarquia da dominação mundial, com os EUA à cabeça, sendo a NATO o principal instrumento da corrida e de consolidação desta hegemonia à escala internacional e, em particular, na Europa.

As guerras abertas, como na Palestina e na Ucrânia, colocam às forças de esquerda o imperativo da solidariedade com os seus povos.

A paz que defendemos não pode ser feita por via da cedência a invasores imperialistas.

As situações beligerantes proliferam um pouco por todo lado, nomeadamente em África, e são uma das grandes causas, se não mesmo a principal, da saída em grande escala de pessoas desses países primeiro para países vizinhos, e muitos para a Europa. A resposta da UE tem sido tornar-se uma fortaleza e recusar grande número de refugiados, chegando ao ponto de pagar a países vizinhos para os conterem.

4. Desafios, Riscos e Oportunidades da luta contra a crise e as desigualdades

O BE tem vindo a preencher o vazio criado pelo recuo das mobilizações dos trabalhadores por uma agenda exclusiva dos movimentos sociais, que se tornaram o centro da intervenção política. Deste modo, alimentou lógicas de preocupações que reforçam sensibilidades individualistas, recorrendo a linguagem, intensidade e ritmo de compromissos de intervenção em que apenas se reconhecem "vanguardas" sociais minoritárias, dos principais centros urbanos. É uma linha política errada e empobrecedora, que torna o Bloco um partido de nicho, dificultando a sua projeção como partido de massas.

O BE não pode alhear-se dos movimentos dos trabalhadores. O que no 25 de Abril se conquistou, em matéria de liberdades e direitos sindicais, de contratação coletiva e de direitos laborais, está em risco 50 anos depois, fruto de dois tipos de circunstâncias. Por um lado, a pulverização e a divisão sindical arrastam o recuo em muitos direitos laborais, estando alguns em risco de desaparecer por efeito da legislação laboral, cada vez mais favorável ao patronato. Por outro lado, a profusão de mecanismos de desigualdade sobre rendimentos e as condições do trabalho – salários, prémios, subsídios, isenções, contratos precários - põem em causa a contratação coletiva e as carreiras a ela associadas.

Anualmente, as centrais sindicais e outros sindicatos ocupam-se com uma espécie de concurso inter‑sindical para saber quem "conquista" mais migalhas junto do patrão, qualquer que seja a sua natureza, em vez dar prioridade à luta pela recuperação da contratação coletiva, ou por melhores condições laborais. Nenhum contrato deve ser decidido nos gabinetes: apenas plenários democráticos, ou mesmo referendos, poderão decidir sobre salários e condições de trabalho.

Os sindicalistas e/ou ativistas do BE não podem continuar a pactuar com a divisão na classe trabalhadora, fruto da proliferação de contratos ou de más decisões, ao arrepio dos trabalhadores, decididas por alegados sindicatos em gabinetes de negociação. Os bloquistas, estejam onde estiverem, têm de ser uma voz ativa contra o divisionismo.

Se falha a democracia sindical, se a prática sindical é divisionista, se os sindicatos burocratizados só se preocupam com os seus filiados para perpetuarem direções, será preferível a demissão e a opção pela (re)construção de formas de organização alternativas que estão para além das burocracias instaladas da CGTP e da UGT: comissões sindicais de base, comissões de trabalhadores, associações sindicais ou mesmo novos sindicatos independentes, sempre que se justifique, onde a democracia seja real e se promova o alargamento da sindicalização, especialmente aos trabalhadores precários e/ou imigrantes.

A opção estratégica de futuro pode vir a ser a construção de alternativa sindical de classe através da promoção de um Fórum Sindical Alternativo capaz de reunir todos os sindicalistas e ativistas, filiados ou não nos sindicatos da CGTP/UGT, em sindicatos independentes ou mesmo sem filiação e que se disponham a discutir e aprovar uma Plataforma Sindical Alternativa orientada exclusivamente pela defesa dos interesses da classe trabalhadora.

O BE foi capaz de trazer para a opinião pública a realidade de um sector de trabalhadores cada vez mais numeroso, os precários, porém essa dinâmica esgotou-se. É necessário renová-la, criando organizações alternativas de tipo sindical para os milhares de trabalhadores que vivem em condições salariais miseráveis.

A Coordenadora Nacional do Trabalho não pode servir apenas para troca de informações e, de vez em quando, para promover uns encontros nacionais onde há demasiado tempo para preleções e pouco tempo para discutir. Deve ser um coletivo de direção, com composição plural, sem sectarismos nem controleirismos, capaz de integrar quem se dispuser a agir pela construção de uma alternativa sindical de classe.

5. O Socialismo por que lutamos

Crises e revoluções, intercaladas com expansões assentes no desenvolvimento tecnológico, alternaram nas últimas décadas. A ameaça atual de uma guerra em larga escala, como outras no passado, sem ou com recurso a armas nucleares, coloca à Humanidade o desafio de sobrevivência enquanto espécie.

Para ser possível recriar uma Utopia mobilizadora da construção de uma nova sociedade, socialista, é indispensável reconhecer que tanto o estalinismo, nas suas diversas facetas, como a social-democracia, foram os principais responsáveis pelo impasse histórico no progresso da Humanidade.

Como Marx, só podemos dizer o que "não pode ser" o Socialismo. Ele não definiu o que tem de ser o socialismo, não construiu um figurino, uma maquete ou o protótipo de socialismo. Defendeu uma "sociedade de produtores livres associados", isto é, uma "sociedade cooperativa" na qual "o desenvolvimento livre de cada um é a condição para o livre desenvolvimento de todos". O "útero capitalista" (Marx) está mais que grávido! Só precisa de uma parteira.

Não basta desafiar manifestações do capitalismo – crise habitacional, crise climática, e lutas identitárias, etc. – se não questionarmos o próprio Capital enquanto relação social determinante e determinada pela produção-valor, por oferta e procura.

Ao combater neste terreno, mostramos que há alternativa e que é possível esboçar as características dessa nova sociedade. Criar um horizonte alternativo é projetar para o futuro o fim do capitalismo como causa última de catástrofes ecológicas e de guerras. Perdendo estas premissas, a esquerda falha.

A problemática ecológica não foi – não podia ser – cabalmente ponderada e analisada, assim como a luta emancipatória das mulheres e tantas outras, pela esquerda clássica dos séculos passados. Porém, o "conflito necessário", o domínio da natureza pela Humanidade, foi considerado como indispensável para uma redistribuição igualitária da riqueza.

Hoje, parar a catástrofe climática e o declínio da biodiversidade requer, sem dúvida, uma redução imediata e significativa do consumo final de energia à escala global. A denominada "transição energética" será um "cavalo de Tróia" na recuperação capitalista da economia, se for entregue aos conglomerados privados. O chamado "crescimento verde" mais não é do que o capitalismo pintado de verde. A socialização dos principais meios de produção relativos à energia, incluindo a água, é indispensável ao combate das alterações climáticas. Ser ecologista é ser anticapitalista, defender valores incompatíveis com uma economia predadora, que se rege exclusivamente pela lei do valor e a busca insane do máximo crescimento do lucro.

A alternativa é o ecossocialismo, assente num planeamento ecológico, democrático, capaz de decidir o que produzir e como produzir, em serviços públicos gratuitos de acesso universal com respeito dos limites da sustentabilidade na utilização dos recursos naturais e materiais, como a água, a floresta, a energia, os transportes e a terra.

6. Um programa para hoje e para amanhã

Os novos movimentos sociais revelam contradições criadas pela própria estrutura do capitalismo - racismo, questões de género, alterações climáticas, migrações, etc. - que só a transformação socialista poderá ajudar a superar. O socialismo que queremos construir não dispensa a tomada do poder pelo proletariado, a socialização dos grandes meios de produção e a agenda socialista de novos movimentos. Sem desenvolvimento do potencial do proletariado, não alcançaremos a vitória da revolução socialista nem a construção de um partido revolucionário. É essencial conquistar e merecer o apoio das massas e a influência junto dos trabalhadores, o que passa por distanciamento crítico e combate ideológico e político às correntes que dirigem os partidos comunistas e social-democratas. Rejeitamos, em absoluto, regimes oligárquicos por vezes ditos "de esquerda", desde Maduro à Coreia do Norte ou à Rússia, do castrismo degenerado ao modelo chinês "comunista". Também rejeitamos a política de gestão do sistema capitalista pelos partidos social-democratas.

Queremos construir uma sociedade socialista, a associação livre dos produtores, uma sociedade de igualdade, de direitos, onde a democracia se aprofunde, pluripartidária, com direitos à greve, à liberdade de expressão e manifestação, de organização sindical e de associação, com mecanismos institucionais que assegurem a separação de poderes. Uma sociedade que, ao contrário dos modelos ditos socialistas do passado, seja muito mais democrática que a atual, onde cada cidadão e cidadã multiplique os seus meios de participação e decisão. O peso determinante, mas não exaustivo, da propriedade pública dos meios de produção facilitará processos de planeamento coletivo e equilibrado dos recursos disponíveis. Só assim se garantem meios de subsistência a toda a Humanidade, e se evita esgotar os recursos do planeta.

Lutamos ainda por uma "governança global", que trabalhe em questões essenciais já identificadas: alterações climáticas, conflitos e segurança, movimentos migratórios, redistribuição da riqueza, questões de saúde, educação, cultura, reforço da democracia e da transparência, entre outras. Nenhuma destas questões terá possibilidade de resolução apenas a nível nacional. O desafio só pode ser pensado a partir da reformulação da ONU, ou de outra estrutura internacional de coordenação, que coloque as nações num patamar igualitário. Urgem decisões de âmbito global, cumprindo e fazendo cumprir o Direito Internacional e os Direitos Humanos, pela Paz, pela adaptação às alterações climáticas, pela preservação dos recursos e da diversidade do planeta Terra.

7. Eleições

Seja qual for o escrutínio, e o número e duração dos mandatos dos eleitos e eleitas, o BE deve nortear-se sempre pela relevância do seu programa ideológico, com visão de futuro, de cariz progressista, transformador e revolucionário, autonomizando-o tanto quanto possível dos ciclos eleitorais. Cada eleição e cada tempo de mandato são oportunidades para afirmar a nossa alternativa.

7.1. Autárquicas 2025

As eleições autárquicas, e o exercício dos mandatos delas resultantes, são ocasiões muito importantes para a construção de um partido já com 25 anos e para a afirmação de uma alternativa de esquerda no plano local. São um terreno privilegiado para trabalho entre aderentes, simpatizantes e contactos, e com outras pessoas sem partido, referências locais, no programa e em listas, reunindo um conjunto de ativistas e de propostas capazes de transformar o quotidiano das pessoas onde nos apresentamos.

A primeira orientação a seguir nestas eleições é que, em tese, o Bloco apresentará listas próprias para reforçar a construção do partido e alargar a sua influência onde tivermos forças para tal. As listas, sempre que possível incluindo cidadãos e cidadãs sem partido, deverão assumir a defesa de um programa alternativo pelo direito à cidade e ao lugar, com propostas sobre cultura, ordenamento do território, urbanismo e qualidade de vida, direito à habitação, transportes e mobilidade, ambiente e recursos naturais, saúde e educação, cultura, coesão social e cuidados, transparência, cidadania e democracia local (ex: o orçamento participativo).

A intenção de assegurar a manutenção de lugares conquistados em atos eleitorais anteriores - vereadores, eleitos em assembleias municipais ou de freguesia - não se deve sobrepor à lógica do nosso combate político mais geral, não só contra a direita, mas também contra políticas erradas do PS e do PCP nas autarquias que governam. Isto significa que o programa deverá ser o critério dominante na negociação de eventuais coligações ou entendimentos com outras forças políticas, antes ou depois do acto eleitoral.

Recentemente, o governo AD trouxe para a agenda política a alteração da lei dos solos. As consequências desta legislação (DL nº 117/2024, de 30 de dezembro) serão desastrosas para o ordenamento do território, urbanismo, ambiente, habitação, mobilidade, agricultura e para os modos de vida das populações em geral. Por isso, esta questão não pode deixar de constar dos nossos programas autárquicos de 2025, sendo uma pedra de toque para eventuais acordos pré-eleitorais.

No mesmo plano, a descentralização de competências, a regionalização e o combate à corrupção são exemplos concretos de questões nacionais com forte reflexo local.

7.2. Presidenciais 2026

Enfrentamos um contexto político e social bastante desfavorável para uma candidatura própria à Presidência da República. Vivem-se tempos de grande refluxo social e político, observa-se o reforço da extrema-direita e de grupos proto-fascistas que dão eco ao discurso securitário e à restrição de direitos e liberdades democráticas. Corre-se o risco de uma candidatura própria ser tarefa muito desgastante e comprometer o objetivo de acumular forças para a mobilização pelas nossas principais causas.

Defendemos que a Direção deve comunicar aos e às aderentes que o posicionamento do BE sobre as Presidenciais será discutido em Conferência Nacional, a realizar por deliberação da Mesa Nacional, reservando para esse momento decisões relativas a candidaturas e campanhas.

7.3. Regionais, Legislativas e Europeias

Cada ciclo eleitoral tem os seus requisitos, impondo-se trabalho continuado de articulações e aprofundamento dos temas programáticos, de modo a consolidar a credibilidade do BE junto do eleitorado.

Da mesma forma, precisamos cuidar de estratégias de comunicação e cooperação entre eleitos e aderentes envolvidos em cada contexto eleitoral – autarquias, parlamentos regionais, nacionais e europeu, presidência da República – de modo a convergir no debate e nas propostas.

8. O Bloco que queremos

Desde há muito que se assiste à tentativa de limitar e silenciar o debate interno, quer no que respeita à expressão de alternativas e minorias, quer no que respeita à generalidade dos militantes, cada vez mais afastados dos processos de decisão e de participação, sobrepondo-se a burocracia à democracia. O estatuto de plenos-poderes, quase incontestado, adquirido pelo secretariado da Comissão Política vai no mesmo sentido. A partir do momento em que o BE esgotou a sua auréola de novidade e foi perdendo terreno na disputa com outras forças políticas mais recentes, tem sido decisivo o papel das tendências dominantes na atrofia do partido.

A existência de tendências faz parte da natureza do BE que, sem a sua aglutinação, nem sequer existiria. É saudável a manifestação de diferentes sensibilidades ideológicas dentro do partido. O facto de haver tendências não é, em si, um problema. O verdadeiro problema é que as duas principais tendências não cuidam de ideologia, focando atenção e energias em aspetos que, em vários domínios, possam favorecer o seu grupo, em prejuízo do interesse comum de todo o BE. O comportamento destas tendências maioritárias fragiliza, frequentemente, a vida democrática interna porque as decisões políticas mais importantes são predefinidas pelas suas cúpulas, servindo as reuniões dos órgãos dirigentes do BE apenas para sufragar as decisões antes "preparadas". Quase sempre, esta "hegemonia partilhada" não respeita as minorias internas, sendo disso sinal a forma como foram sendo expurgadas da participação em Convenções, de que é exemplo o sucessivo aumento do número mínimo de subscrições para apresentar moções. Esta maioria bicéfala dominante patrocina a disputa por lugares e não por ideias, porque cada uma das tendências dominantes tem uma agenda própria, que visa colocar os seus membros em todos os lugares de destaque. Acontece a mesma pessoa acumular mais do que um lugar de representação pública, inclusive em diferentes regiões, o que enfraquece a sua disponibilidade para ação eficaz e dedicada, e favorece o carreirismo e a ascensão de dirigentes sem condições para melhorar a qualidade da preparação e intervenção políticas.

Dado o esvaziamento político do debate interno em todo o BE e a evolução da distância entre as ideias das duas principais tendências, estas, em vez de conviverem fraternalmente com as suas diferenças, tendem a reduzir a sua práxis apenas ao poucochinho em que estão de acordo. Ou seja, renunciamos a discutir, aprofundar, inovar e criar política, em nome da coexistência pacífica entre as duas maiores tendências.

A falta de democracia interna é o principal factor de fragilidade do BE. O Bloco tem de voltar a ser mais, e querer ser mais, que a soma de votos e vozes de grupos que estiveram na sua origem.

À medida que o Bloco foi perdendo relevância política, foi-se encostando a uma estratégia tornada dominante à esquerda: articular-se com todos os movimentos sociais, sobretudo com os que conferem mais visibilidade mediática, independentemente de considerações políticas ou prioridades estratégicas. O resultado é uma espécie de amálgama sem identidade, que só serve para criar a sensação de "movimento", seja ele qual for. Este modelo de "movimento dos movimentos" opõe-se à ideia de partido de massas para uma profunda transformação social, uma revolução. Um partido que "atira em todas as direções" sem definir critérios de importância e prioridade política acaba por não atingir nenhum objetivo significativo.

O BE precisa de se refundar, valorizando sem medo o papel insubstituível das minorias, em vez de as asfixiar. Precisa de se democratizar de alto a baixo, começando pela libertação do Esquerda.net do controle rígido da maioria. A imprensa do Bloco deve ter e ser um espaço dedicado e totalmente aberto ao acesso e à contribuição de qualquer aderente que queira exprimir opiniões próprias. O Esquerda.net é um órgão de comunicação de qualidade, com uma audiência alargada, porém corre o risco de ser um órgão oficioso da direção. As minorias com acesso à Comissão Política devem ter representação na direção do Esquerda.net, garantindo maior pluralidade.

Para estimular o debate interno, o Esquerda.net deve prever um espaço digital de acesso livre a qualquer aderente, onde se possam publicar artigos ou comentários que apreciem a orientação política do BE, permitindo e promovendo a crítica e o livre debate entre todos e todas. Esta e outras formas de participação e de envolvimento direto dos e das aderentes, diversificando tecnologias para cultura de comunicação em rede, contribuirão para um Bloco mais democrático, participativo, plural, vivo, dinâmico e, ao mesmo tempo, integrador e mobilizador.

O peso esmagador de funcionários em todas as instâncias do BE deve ser combatido com alterações estatutárias, como já foi tentado no passado. O BE transformou-se num partido de funcionários que comandam a vida política quotidiana do partido, por intermédio da sua submissão ao secretariado da Comissão Política. Esvazia-se a autonomia política das direções regionais e locais eleitas bem como dos responsáveis pelas direções de intervenção sectorial: sindicatos, autarquias, grupos de trabalho, etc.

O mesmo se aplica à concentração das tarefas ao mais alto nível e em mandatos sucessivos, por parte de um núcleo muito restrito de camaradas, ano após ano. Isso diminui a eficiência do desempenho, cria vícios e riscos de autoritarismo, reforça modos de oligarquização. A duração dos mandatos e o número de mandatos atribuídos a cada eleito ou eleita devem ser limitados temporalmente.

Queremos ampliar a ligação do BE às pessoas, reforçar a inserção dos e das aderentes em núcleos e organizações de base, melhorar a prática democrática e o conteúdo político dos órgãos, estimular a sua autonomia, respeitar as suas funções estatutárias, refrescar os quadros em quantidade e qualidade.

Só o Bloco em novo rumo, um partido com prática democrática viva e aberta, terá meios para lutar pelo socialismo que queremos.

Subscritores iniciais:

Adelino Fortunato

Alexandra Vieira

Alexandre Mano

António Cruz Mendes

António Gil Campos

António Marinho da Silva

Carla Magalhães

Carlos Patrão

Clara Dumont

Cristina Biguetti

Duarte Graça

Elísio Carvalho

Fernando Gandra da Silva

Fernando Queiroz

Filipe Rosas

Heitor de Sousa

Helena Figueiredo

João Nóbrega

Jorge Pereira

Jorge Rato

José Carita Monteiro

José Estrela

José Manuel Boavida

José Peixoto

Luís Sottomaior Braga

Luísa Ramos

Luísa Santos

Manuel Azenha

Maria José Vitorino

Maria Marreiros

Maria Paula S Neves Carita

Nelson Calheiros

Nuno Pinheiro

Patrícia Barreira

Paula Cristina Brum da Silveira

Rodrigo Hora Marques

Ruben Fernandes

Rui Ferrão

Sara Goulart

Vítor Tojeira

Vitorino Pereira


Camarada,


Queremos um novo rumo. No socialismo por que lutamos cabe toda a gente, com esperança e dignidade. Só assim fazem sentido ideias, propostas, políticas, palavras e ações. Lutar, falhar, errar, corrigir, porfiar. No Bloco de Esquerda, sempre.

Se te identificas com o texto desta moção convidamos-te a subscrevê-la no formulário ou através do email radarrededeativistas@gmail.com (nome, contacto, número de aderente, localidade).

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